quarta-feira, 28 de março de 2012

QUINZE CENTAVOS DE DIREITOS


Por Marcos Monteiro*
Todo ano, por esse tempo, na cidade onde moro, Feira de Santana, uma certeza: a passagem de ônibus vai aumentar e os estudantes vão reagir, o máximo possível. As manifestações estudantis são contra quinze centavos a mais propostos por um conselho municipal de transporte a ser examinada pelo prefeito da cidade. Tudo indica que a passagem será de R$2,50 a partir de abril.
Na história das mobilizações, estudantes já deflagraram movimentos capazes de derrubar presidentes e balançar regimes ditatoriais. A movimentação contra aumento de passagem de Feira de Santana permite-nos pensar sobre algumas coisas.
Todo manifestante sabe que o problema não é o preço da passagem, mas passagem de ônibus ter preço. Transporte público gratuito e de qualidade é bandeira maior, embutida nessa pequena luta de quinze centavos. Feira tem um dos piores serviços de transporte do Nordeste e um dos mais caros, basta conferir. E a concessão para transporte urbano passa por aquela típica contaminação entre um setor privado e um poder público manipulado pelos interesses daquele.
No jogo político jogado entre sociedade civil e sociedade política, as mobilizações parecem estar cada vez menores e pontuais, reflexo do avanço avassalador do sistema capitalista. Faz-se a mobilização possível na meta do direito impossível. Na mobilização de quinze centavos organizada pelos estudantes, o pano de fundo maior são os preços de todos os nossos direitos e especificamente o direito de ir e vir.
Quando lemos a Declaração Universal dos Direitos Humanos nos sentimos diante de um excelente cardápio, mas sem os preços afixados.
Lembro de dois episódios ilustrativos. O primeiro, a peça “Liberdade, liberdade”, com a irreverência de Millôr Fernandes e o traquejo de Flávio Rangel, em que o texto brinca com o “preço da liberdade”. Em plena ditadura, sob o olhar de uma censura que torturava de verdade, eles afirmavam teatralmente que o preço da liberdade para o Brasil, fixado pelo FMI, seria de “três portos e dezessete jazidas de minerais estratégicos”.
O segundo, conversando com um adolescente de periferia em Recife, cerca de dez anos atrás, perguntando se ele já havia visitado o Shopping Center. Ele arregalou os olhos e respondeu: “– Não!!! é muito cara a passagem, é um real”. O direito de ir e vir para ele seria de dois reais, uma exorbitância.
São inúmeras as situações que demonstram que o atual sistema econômico e político, no mundo todo, não tem a capacidade de nos assegurar os direitos que prometem. Imigrantes, por exemplo, cada vez mais desfrutam apenas do direito de voltar compulsoriamente. O segundo verso da famosa poesia, “A Pátria”, de Olavo Bilac, “criança! não verás nenhum país como este” tornou-se profecia óbvia para a maioria e para alguns pode ser atualizada como “não verás nenhum bairro como este”. Culpa de preços de passagens.
Falta um direito na Declaração Universal: o direito de lutar por direitos. Esse, os estudantes exerceram, nos deixando essa insistente lição. Em um mundo de desesperança e acomodação não podemos abandonar nenhuma luta. Sempre é preciso lutar, mesmo que seja por quinze centavos de direito.
Feira de Santana, 23 de março de 2012
*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia.

Abaixo-assinado contra o aumento abusivo da tarifa de ônibus em Feira de Santana/BA – R$ 2,50 Não - http://www.revoltabuzufsa.blogspot.com.br/2012/03/abaixo-assinado-contra-o-aumento.html

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Um comentário:

  1. É um verdadeiro desrespeito, e não basta cobrar cara e aumentar todo ano, ainda tem os vários desaforos que os passageiros têm que ouvir dos motoristas e a demora em muitas linha. Isso tem que ter um basta.

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